EUCLIDES DANTAS

EUCLIDES DANTAS

Mozart tanajura relata que Euclides Dantas dividiu seu tempo entre o magistério, o jornal, o seu gabinete de trabalho e as associações literárias que ajudou a fundar. Como professor fundou e dirigiu colégios. Como jornalista, foi redator e colaborador assíduo de vários jornais, a partir de 1910, quando surgiu o primeiro jornal da cidade – A Conquista.
Como teatrólogo fez um teatro voltado para a moralização dos costumes e para o patriotismo. Usava como uma forma de complementação às suas atividades pedagógicas.
Como romancista, deixou “Terras” romance regional em que o autor focaliza fatos ocorridos no Município no fim do século XIX, como a “Tragédia do Tamanduá”.
Como poeta legou à cidade o livro “Árvores Mortas”, coletânea de poemas de editado em 1937. Repentista e epigramista ferino, deixou sátiras de fundo político e social que marcaram uma época.

A pedidos, “escreveu na perna” este soneto satírico, dedicado aos bajuladores dos chefes político e que são autênticos madrinheiros.

O MADRINHEIRO

Em rente a tropa, segue, sobranceiro,
Ostentando vistosa cabeçada
Cheia de guisos, toda ornamentada,
O mais belo do lote: o madrinheiro.
           
           As demais alimárias, do guieiro
           Obedecem, a marcha compassada;
           Grave, marcando o rumo da jornada,
           Tem aspecto de nobre mensageiro...
           
                       Entretanto, conduz também a carga, 
                       Dois volumes pesados, igualmente,
                       Que o destino do burro não larga...
           
                                 Quantos que a gente, pelo mundo, topa.
                                 São no orgulho risível e inconsciente
                                     Madrinheiros legítimos de tropa! ...




Nos brindou com seu mais belo presente para Vitória da Conquista que foi o hino:


Conquista, joia do sertão baiano/ Esperança ridente do Brasil / A ti, meu orgulho soberano / O afeto do meu peito juvenil // A ti minha esperança no futuro / Os sonhos do meu casto coração / És e sempre serás meu palinuro / Ó pérola fulgente do sertão.

Conquista tesouro imenso… / O mais belo da Bahia / Que primor, que louçania / Tem mais brilho aqui o sol // Conquista terra das rosas / De florestas seculares / Tem mais amor em seus lares / Que luzes no arrebol.

Deixar o doce encanto destas ruas / Deixar teu céu que tanto bem almeja / Eu morreria de saudades tuas / Minha querida terra sertaneja // Entretanto, se a pátria me exigir / Deixar-te para a pátria defender / Este afeto bairrista é vã mentira / Pelo Brasil inteiro irei morrer!

Surge o sol, fogem pássaros dos ninhos! / Todos vão venturosos trabalhar / Eu também imitando os passarinhos / Deixo o morno regaço do meu lar // Para a escola caminho satisfeito, / Da pátria vou saber as glórias mil / Conquista, que emoção vibra em meu peito / Ao fitar-te no mapa do Brasil.

Vocabulário

Ridente: alegre; risonho; satisfeito.
Palinuro: piloto; guia.
Fulgente: brilhante.
Louçania: garbo; elegância.
Arrebol: cor afogueada que toma a atmosfera antes de o sol nascer ou depois de ele se pôr.
Bairrista: diz-se de ou pessoa muito afeiçoada ao seu bairro ou à sua terra.
Venturoso: ditoso; feliz.

Regaço: seio, lugar onde se acha conforto e tranquilidade.


Com o fim da guerra de 1918, fez este cordel:
 O FIM DA GUERRA – ABC    dedicado ao amigo Demósthenes Rocha



A guerra está terminada,
Reina a paz, reina alegria!
Acabou-se a trovoada,
Que roncava, noite e dia...
Que samba, rapaziada,
Se não fosse a epidemia!

Brasileiros, exultemos,
Nossa pátria fez figura;
Da victória partilhemos...
Quando a coisa estava dura,
Nós na guerra nos metemos,
Sem temer a desventura!

Com furor insaciável,
A Alemanha fez a guerra;
Seu orgulho inimitável,
Quis tomar conta da Terra...
Que loucura formidável!
O dedo de Deus não erra!

Danado monstro terrível,
O imperador da Alemanha
Já se julgava invencível;
Mas, quem bate, um dia apanha...
Está preso o bicho horrível,
E nossa causa está ganha!

Europa velha, coitada,
Sofreu muitos dissabores;
Quase morre mergulhada
Num mar de sangue e de dores!
E a Alemanha excomungada
A querer novos horrores!

França invicta, gloriosa,
Sofreu, mas não foi vencida;
Ei-la, enfim, vitoriosa,
Cheia de força e de vida!
Salve, França esplendorosa,
Bela na paz e na lida!

Grandes foram as maldades
Que a Alemanha fez ao mundo,
Traições e perversidades;
Mas, o Guilherme Segundo
Verá suas crueldades
Lá no inferno bem profundo!

Hoje as Nações Aliadas
Viverão eternamente
Risonhas, entrelaçadas,
Num abraço refulgente,
Livres das fúrias danadas
Do tirano impenitente!

Inglaterra se levanta
Dum leito de nenúfares,
E os hinos de glórias canta,
Rebrilhando, entre os seus pares;
O mundo inteiro decanta:
- Salve, Rainha dos Mares!

Já não há mais barbarismo!
Os povos civilizados
Calcaram o Kaiserismo!
Hoje, todos são ligados
Por um só patriotismo...
Venceram os aliados!

Kaiser fugiu, pois mofinos
São todos os malfasejos;
Dos boches maus e assassinos
Fracassaram os desejos...
Tornaram-se pequeninos,
São pobres animalejos!

Lá no velho Continente
Houve choros e tristezas;
Dobrava o sino plangente,
Mágoas, lutos, incertezas;
Troava o canhão potente,
Repercutindo cruezas...

Mas, Jesus ouvira o grito
Dos sofredores cansados;
E, descendo do Infinito,
A terra dos vis pecados,
Disse: - Basta, ódio maldito,
Quero a Paz, filho amados!

Navios que viajavam,
Neutros, pelos oceanos,
Sem esperar, sossobraram,
As balas dos desumanos
Alemães, que saltearam,
Com traições e maus enganos!

Ó terror jamais havido
Na História da Humanidade!
Ficarás inesquecido,
Pela tua crueldade;
Nunca serás redimido,
Rei do crime e da maldade!

Portugal, nação potente,
Camões, no céu te abençoa;
És generoso e valente
És pátria da gente boa;
Tua glória, eternamente,
No mundo inteiro ressoa!

Quem julgara que o inimigo
Tão depressa correria?
No momento do perigo,
Pôs à vista a covardia!
O Kaiser não teve amigo
Na Áustria, Bulgária e Turquia...

Rei Alberto, te devemos
Grande parte da vitória!
Aliados, celebremos
O nome cheio de glória
Do Rei Alberto, que temos
Em letras d’oiro, na história!
Servia, nação pequenina,
Mas, forte no sofrimento,
Soube ser nobre heroína,
Sem recuar um momento!
Mas a Alemanha assassina
Fugiu do campo sangrento...

Trouxe guerra, peste e fome
O Kaiser, com seu reinado;
Seu povo está revoltado,
Excomungando-lhe o nome;
E se não fog o malvado,
Lá mesmo, o povo o consome...

Uma grande carestia,
Por toda a parte alarmando,
Ao rico, ao pobre fazia,
Deixava o pobre esmolando;
Para vir mais maltratando,
Chega, enfim a epidemia!

Veneza, quase é tomada, mas venceu com galhardia;
A Itália é glorificada
Pela sua valentia!
Salve, querida aliada,
Bela pátria da harmonia!

Wilson, defensor potente
Dos fracos, dos oprimidos,
Luz do Novo Continente,
Grande amparo dos vencidos!
Tão forte, mas complacente;
Glória aos Estados Unidos!

Xarque tornou-se tão,
Que o pobre já não conhece;
Bacalhau, isso é tão raro,
Nem mesmo ao rico apetece;
E a branca de Santo Amaro
Quase que desaparece...

Yankees, belgas, ingleses,
Rumaicos, italianos,
Sérvios, gregos e franceses,
Povos sul americanos,
Japoneses e chineses,
Viva a Paz por dez mil anos!

Zumbe o remorso indisível,
Qual besouro vil, medonho,
Em pesadelo terrível,
Quer desperto, quer no sonho;
Eu julgo ser impossível
Ao Kaiser, dia risonho!

Conquista 12-dezembro de 1918

Euclydes Dantas.

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