CAMILLO DE JESUS LIMA
Nasceu
no dia 8 de setembro de 1912, na histórica cidade de Caetité, sendo seus pais o
professor poliglota Francisco Fagundes de Lima e D. Esther Borba de Lima.
Seus
pais transferiram residência para esta cidade em 1918, quando o ilustre poeta
tinha apenas 6 anos de idade. Teve apenas o ginasial incompleto. Porem dotado
de aguçada inteligência aperfeiçoou-se, tornando-se um apreciado escritor, um
dos maiores poetas do Brasil e grande crítico literário. Falava e escrevia
corretamente os idiomas inglês, francês, castelhano e conhecia a língua latina
com perfeição.
Foi
professor particular em Encruzilhada, foi professor no Ginásio de Conquista, foi
secretário da Prefeitura na gestão de Régis Pacheco. Fundador da “Ala das
Letras de Conquista” e como brilhante jornalista foi redator dos jornais “O
Combate” e “O Jornal de Conquista” e colaborador de “O Conquistense” e “O
Sertanejo” publicando poemas, crônicas e críticas literárias, podendo-se
afirmar que estas publicações reunidas dariam para a edição de volumoso livro.
Foi colaborador do jornal “A Tarde”. Por longos anos foi o titular do cargo de
Oficial do Registro de Imóveis e Hipotecas da Comarca de Macarani.
Espírito
verdadeiramente democrata socialista, foi denunciado como integrante do Partido
Comunista Brasileiro, sendo detido em Macarani em maio de 1964 e conduzido a
Salvador pela força do Exército que esteve em nesta Cidade. Envolvido em inquérito
policial, nada foi apurado que justificasse a denuncia, sendo o processo
arquivado pelo Tribunal por falta de provas. Passou na prisão cerca de 4 meses.
Faleceu em 3 de março de 1975, em decorrência de um acidente por atropelamento
ao saltar de um carro na cidade de Itapetinga no dia 28 de fevereiro.
O
grande poema e Camillo, segundo apreciação de críticos literários é “Lição,”
que foi traduzido e publicado em vários países da Europa: Polônia, Rússia e
Espanha.
LIÇÃO
-
Mestre,
Que
hei de fazer, quando os pássaros cantarem
Vendo
o Sol-rei do fogo a dourar a montanha?
É
preciso que eu seja uma sombra, eu, tão moço?
Hei
de ser triste em meio alegria tamanha?
-
Filho,
Essa
voz que quer cantar a vida
Não
a sufoques nunca na garganta.
-
Mestre,
E
que hei de fazer quando os pássaros cantarem?
-
Canta.
-
Mestre,
E
se um dia o amor – esse veneno lento,
Áspero
como a penha e brando como o lírio,
Vezes
tranquilo como o céu, vezes violento
Como
o mar, como os leões, como o delírio,
Se,
um dia, o amor me aparecer?
-
Enfrenta-o.
Avança
para o amor, se o amor te reclama.
-
Mestre,
E
que hei de fazer ante o amor, se vencido?
-
Ama.
-
Mestre,
Se
um dia – ai! – como é triste este caminho! –
Alguém
vier para mim – velho, moço – criança –
Coração
sem amor, boca sem pão, ave sem ninho?
-
Dá-lhe a alma, que é calor. Dá-lhe esperança.
-
Mestre,
E
onde irei buscar alma – essa alma que aquece?
E
essa esperança – ela que alenta e revigora?
-
Filho,
Tudo
em ti mesmo está. Vem de ti. Ouve:
Chora!
-
Mestre,
Se
a terra adusta, do sol cruel martirizada,
Ventre
ansioso a esperar um alguém que a fecunda.
Chamar
por mim, como a mulher amada,
Prometendo
a riqueza, o conforto, a fortuna?
-
Filho,
Levanta.
Retesa seus músculos. Malha.
Cava.
Sua. Fecunda a terra e criarás um mundo.
Trabalha!
-
Mestre,
Se,
um dia, os déspotas malditos
Desejarem
fechar a minha boca
Para
que eu não grite mais, não clame mais?
Mestre,
meus pensamentos e meus brados
São
livres – como os vendavais!
Mestre,
se esses monstros a minha liberdade
Querem
ver cativa? Na hora ingrata,
Mestre,
na hora tremenda, que farei?
-
Mestre,
Se,
um dia, enrouquecer-se a minha voz que canta?
Se,
um dia, envelhecer meu coração que ama?
Se,
um dia, empedernir-se a minha alma que chora?
Se,
um dia, cansarem-se meus braços que trabalham?
Se,
um dia, eu não tiver coragem de matar
Para
que a liberdade não pereça?
Mestre,
que hei de fazer? Que serei eu na terra?
Fala!
De tua boca a verdade dimana,
Como
um leite sagrado,
Bálsamo
suave que de teus lábios escorre
-
Mestre,
Tudo
acabado, eu só, eu sem nada, eu cativo,
Mestre,
que hei de fazer?
-
Escuta, filho:
-
Morre!
A VISÃO DO MARTIR
Dá
um pedaço da tua terra ao teu irmão
Para
ele trabalhar e para ele morrer.
Lança
os teus olhos para as aves livres.
Vê
que elas voam, navalhando o céu infinito.
É
assim que a tua alma deve ser.
Divide
com teu irmão o teu manto.
Mistura
um pouco do teu pranto à angustia do seu pranto.
O
pão que vem dos trigais louros
Dá
para o teu sustento e para sustentar
Todos
os que têm fome.
Toda
a gente que vive a gemer e a chorar.
Quando
eu falei assim a turba vociferou,
E
zombou e sorriu.
Esmurraram-me
a face
Laceraram-me
as carnes.
Escarraram-me
no rosto macilento
E
ataram-me à corrente como um lobo bravio.
Entretanto
a manhã era clara e bonita.
Aves
voavam soltas pelo espaço,
Livres
como o pensamento
A
terra imensa e infinita
Abria
o seio numa floração
E
os trigais louros como cabeleiras
Vergavam
ao peso das espigas
Curvando-se
ante a miséria dos famintos,
Na
oferta magnífica do pão...
O
poema Viola Quebrada narra o drama
vivido por João Macambira, retirante da seca que, ao chegar numa cidade, tem
sua viola despedaçada pelo delegado do lugar ("Velha formiga que não gosta
de cigarras").
Seu
delegado!
Que
foi que eu lhe fiz
Pra
vosmeçê fazer assim
Rebentou
minha viola
Bateu
vinte vezes em mim
Que
é que a pobre da inocente
Fez
de mal em minha gente?
Esse
falso testemunho!
Apois
que foi quem levantou?
Quem
bate numa viola, num tá bem certo da bola
Bate
em nosso senhor
Escute
seu delegado!
Quem
bate numa viola, com mão de raiva zangado
Da
tapa na cara da mãe, chama o pai de desgraçado.
Minha
viola é de pinho homem!
Quantas
vezes pelo caminho, queimado de tanto sol
Eu
tirava ela das costas, e sentava junto a estrada
E
tocava uma toada, triste de fazer dó
Nenhum
passarinho nos gaios
Nos
gaio nenhuma foia
Com
os pés pocado de bolha, e as mãos tremendo de fome
Quando
eu tirava das corda, a toada que ela gemia
Os
mal e a dor eu esquecia e virava mesmo outro home
A
barriga no espinhaço, com três dias de jejum
Mesmo
assim não dava ela a outro pro preço nenhum
E
quando no rancho de noite, cantando pra não chorar
Eu
chegava ela nos peito
Ah!
Viola companheira
Que
as vezes pensava inté que tava mesmo abraçado
Nos
braços de uma muié
Da
viola pra muié, é pequena a deferença
Vosmeçe
olhe, escuta, e pensa
Eu
juro essa fala é franca, a viola tem cabelo nas dez corda que ela tem
Tal
e qual uma mulher, ela tem braço tem cintura tem anca
A
viola faz chorar e chora a hora que quer
Tal
e qual uma mulher, derrete toda na mão, da pessoa que quer bem
Nas
sentinela dos anjos, nas festas nos povoado, nas paixão e nos amor
Essa
viola bonita que ançê agora quebrou
Sempre
andou junto comigo, nunca me deixou
Oia!
acredita seu moço, vosmeçe disse que nos é cigarra vadia e vive sem trabaiar
Burro
de carga na vida, sela num pode levar
Nós
num nasceu pra ser rico Dotor, nos nasceu foi pra cantar
Nós
nasceu abrindo os zóio, pras beleza do sertão
Deixa
nós morrer de fome, se essa é a sina patrão
Deixa
nos botar pros zóio, feito em agua o coração
E
quando o sol, de marvado, começou nos castigar
E
os fiinhos morto de fome, abrir a boca a chorar
Eu
pegava ela e tocava, para eles acalentar
O
mio que Deus mandava muito é pouco que Deus dá.
Mas
um dia, foi preciso botar o povo na estrada
Que
aquela terra coitada, Deus dela bem que esqueceu
Que
coisa que dói seu moço é deixar o ranchinho que a gente nasceu
Vançe
nuca viu, a serra vremeia, de fazer medo
O
solo queimano e acabando com tudo, derna de cedo
Você
nunca viu, um filho morrer de fome nos braço
Vosmeçê
e gordo ricaço, e eu seu moço, na vida sou feito um zumbi
levando
vida de cachorro, andando daqui pra ali
Tá
chorando seu delegado? Tá sentindo alguma dor?
Pena
de mim? Mas por que?
Oia!
acredita seu moço, que eu assim como tô, rasgado passando fome
como
cachorro, vendo em pedaço a viola que meu avo me deixou
Oia
acredita seu moço, eu não tenho nada não
Eu
tenho o tempo nos zóio tudo que eu vi no sertão,
tá
sartando na minha alma as caboca do baião
eu
tou vendo a lua cheia, cor de queimada nascendo, alva que nem um novelão
Oia!
acredita seu moço, bicho macho é o coração
E
ele que tá falando, no meu ouvido patrão
Não
chora, que eu guardo os caco, para amar e querer bem
Coisa
melhor pode haver, o que a gente pode ter, o que teve e já não tem
Mas
comigo não teve choro, a flor que não morre nunca, que vai comigo pra cova
sempre
viva e sempre nova, sempre cheia de bondade
viola
que nós não quebra, feitiço que nós conhece
pelo
nome seu delegado, pelo nome seu delegado
De
sodade!
AMIGOS
Os
poetas se entendem. Bem que existe
Misteriosa
atração que os liga. É certo.
Por
isso, ó vida boa, nos reuniste,
Como
a cinco palmeiras num deserto.
Irmãos
em sonho, - sonho que ainda insiste
Em
perfumar os nossos dias, - perto
De
vocês sinto a vida menos triste,
-
Clara e linda manhã de sol aberto...
Vede,
opulentos! Mesmo pobrezinho,
Trago
ao peito um tesouro, com carinho,
Maior
que o vosso mil milhões e vezes:
Pepitas
de amizade... joias santas...
Laudionor
A. Brasil... Euclides Dantas...
Clóvis
Lima... Erathósthenes Menezes...
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